Grupo de Vésperas

*Texto originalmente postado na página do Grupo de Vésperas do CMU, USP

RESUMO DO 6º ENCONTRO: Vai ser difícil resumir essa... Ontem nos debruçamos durante três horas sobre os rascunhos do quarteto de cordas e os estudos para saxofone de André Mestre cuja escrita origanalíssima dispensa elogios. Empregando um sistema combinado de tablatura e pauta tradicional André trouxe para nós uma nova realidade de escrita e poética musical a qual levantou muitas questões e discussões que se estenderam por três horas. Em resumo...

O André já havia me antecipado esta tendência atual em sobrepor sistemas de tablatura ao sistema de notação convencional que remontam ao "Gesti" de Berio e, posteriormente, a Lachemann. A grande novidade no uso deste sistema composto é que ele permite trabalhar direta e artesanalmente sobre a materialidade sonora via aporte gestual. Precisamente, trata-se de dar autonomia aos componentes gestuais, no sentido em que os signos gráficos deixam de orbitar em torno do pentagrama (enquanto acúmulo de sinais e indicações linkadas as notas) e passam a constituir uma camada individual sobreposta as linhas, criando assim o que chamamos de "polifonia de registros". Creio, isso ficou claro para todos no duo para Violino e Violoncelo ("Narrow is the Road") onde cada músico tem a sua frente uma pauta e uma tablatura sobreposta, sendo que esta permanece em "únissono" gestual no decorrer da peça, enquanto as "notas" e notações no pentagrama diferem substancialmente em rítmica e componentes materiais. Construção semelhante e mais desenvolvida encontramos no quarteto ("Corpo Confesso"). A última peça, os três dos cinco estudos para saxofone ("The Sorrowful Mysteries") que ouvimos - também com tablaturas mais leves - chamou a atenção pelo conjunto coordenado de técnicas extendidas, de modo a buscar uma linearidade "discursiva" fora dos eixos tradicionais, ou como o André chamou, se valendo da semiótica, de estar fora dos eixos "simbólicos" que reiteram as mesmas convenções discursivas. O terceiro estudo em notação circular apresentou uma grande proposta de roteirização livre (obra aberta) de leitura. Ampliando a proposta do Crumb em "Makrokosmos" este terceiro estudo funciona em três círculos coodependentes, três anéis sobrepostos, onde o intérprete, mediante alguns caminhos indicados, salta de um círculo ao outro e atinge velocidades diferentes. Todo material é derivado de um cantochão que cohabita no círculo interno com algumas vogais e consoantes extraídas dos cânticos. Vale notar ainda a intenção com que isto é feito, que nas palavras do André, vem a se tratar de expor o intérprete ao público, transitar na penumbra, transitar numa linha instável que separa (ou funde) o público da música contemporânea. Para quem lembra do encontro com o Rodrigo Bussad no ano passado em que falamos de uma questão de zona de risco e trocas de escutas com intérpretes... pois bem, vemos a questão aqui ser rearticulada em outro contexto. Termino essa dizendo foi um enorme prazer contar com o André para este encontro.

Espero que todos tenham se animado a compor para o que virá em breve.
Creio que esta última peça nos deu uma amostra de quem estará aqui para o workshop em Agosto (Alisson Balcetis).

André Ribeiro é compositor e pesquisador. Saiba mais.